Claudio Edinger

Comentários 14

QUEM | Claudio Edinger.

ONDE | São Paulo.

PORQUE | A primeira lembrança que tenho de Edinger é do ensaio sobre loucura, feito no Juqueri. Totalmente influenciado pelas fotos de Edinger, em 1995, produzi uma matéria sobre a Tamarineira (hospital psiquiátrico no Recife) para o Jornal do Commercio. Edinger tem um trabalho baseado em grandes ensaios e obras publicadas em livros. Atualmente, “brinca” com a realidade e transmuta cidades e cenários do dia a dia com sua câmera de grande formato.

Foto: Maira Coelho

Currículo fornecido pelo fotógrafo:

 

Claudio Edinger, autor de 13 livros fotográficos, recebeu duas vêzes o Prêmio Leica de Excelência em 1983 e 1985 pelos seus livros de fotos Chelsea Hotel e Venice Beach. Recebeu o Prêmio Ernst Haas em 1990 pelo seu trabalho fotográfico no asilo do Juqueri. Seu livro sobre o Carnaval recebeu o prêmio Higashikawa do Japão, de melhor fotógrafo estrangeiro em 1999 e a bolsa Vitae em 1993. Suas fotos para a revista Newsweek receberam o prêmio Pictures of The Year em 1996. Seu livro de fotos sobre Habana Vieja foi eleito um dos dez melhores do ano pela revista American Photo, em 1997. Seu trabalho sobre o Rio de Janeiro foi escolhido como um dos melhores do ano pela revista Photo District News. Seu projeto sobre São Paulo recebeu o Prêmio Porto Seguro em 2007. Suas fotografias já foram expostas em várias galerias e museus nacionais e internacionais e foram publicadas nas maiores revistas do mundo.

Site: www.claudioedinger.com

Bom Jesus da Lapa | 2005

Povoado da Passagem | 2005

OLHA, VÊ Como a fotografia entrou na sua vida?

CLAUDIO EDINGER Quando comecei a estudar filosofia no segundo colegial quis saber quem somos, por que estamos aqui e por que tudo isso existe. Ao mesmo tempo, eu lia Tolstoy que dizia, sem saber quem somos, por que estamos aqui a vida é impossível. A fotografia é um ótimo instrumento de conhecimento. Era também uma época muito política e todo mundo tinha muito o que falar – geralmente contra a ditadura militar. A fotografia era a linguagem universal e no fim dos anos sessenta, começo dos anos setenta, ela tomava um rumo, documental/artístico que mexia muito comigo. O tempo passando sem parar causa muita angustia. Poder segurar o tempo nas mãos, no filme, era uma coisa extraordinária demais.

OLHA, VÊ O que lhe chama atenção na fotografia atualmente?

CLAUDIO EDINGER A fotografia vive agora o que a pintura viveu no fim do século 19, começo do século 20. Estamos entrando numa nova era, como a que surgiu na pintura a partir do impressionismo, que acabou dando origem a todas as escolas de pintura contemporânea – expressionista, cubista, moderna, etc. Houve um rompimento com o passado e coisas extraordinárias estão começando a acontecer. Paralelo a isso a arte fotográfica se valorizou muito – no ano passado um trabalho de um fotógrafo alemão, o Andreas Gursky, de 50 e poucos anos, vendeu por 3.4 milhões de dólares. Isso tem favorecido muito a fotografia arte, a foto fine arts, possibilitando pesquisas em várias direções, sem vínculos comerciais, jornalísticos ou com a foto documentária (mas não necessariamente deixando de ser documentária). A fotografia tem se expandido horizontalmente nas direções mais diversas. E isso é só o começo. Também ficou muito mais fácil e barato fazer livros de fotos. Hoje eu faço tudo em casa, coisa que há dez anos atrás era impossível: escaneio e trato as imagens, faço a diagramação, a edição e a direção de arte, tudo no computador. Ficou muito mais fácil. Há também as gráficas de pequenas edições, qualquer um pode ter seu livro publicado. Nem que seja só uma cópia.

OLHA, VÊ Hoje, o que ainda lhe atrai fotografar ou ainda pensa em fazer? Quais são os seus próximos ensaios?

CLAUDIO EDINGER Estou cada vez mais interessados em fotografar tudo à minha volta. Em geral o que me interessa fotografar são as coisas, lugares, pessoas que me cercam, que me dizem respeito e que me ajudam a entender quem somos. Quero muito fotografar a Amazônia com a 4×5. Quero ir pra Shanghai, centro do comércio chinês. Estou fotografando Paris antes do fim do mundo (ou pelo menos fui pra lá pensando nisso), o sertão da Bahia, que é a alma singela, poética e carinhosa do brasileiro. Quero fazer de novo uma série de retratos, talvez de travestis, um projeto chamado Homemulher. Quero fotografar Los Angeles. Uma cidade com 50% de latinos… Cada dia aparecem coisas novas que eu quero fazer e como só tenho feito isso, faço poucos trabalhos comerciais. Tenho conseguido viver de meu trabalho pessoal, um investimento que há trinta anos venho fazendo e que agora começa a dar frutos (financeiros, que pessoais, desde o começo a satisfação de fazer projetos assim sempre foi imensa).

OLHA, VÊ Toda a sua produção é marcada por grandes ensaios. Como você definiria um ensaio fotográfico? O que precisa um trabalho para ser qualificado de ensaio?

CLAUDIO EDINGER Um ensaio é uma oportunidade de nos aprofundarmos num tema que nos diz respeito. O resultado é sempre muito melhor do que fazer uma foto aqui outra ali (se bem que pra muitos isso pode ser o seu ensaio). Comecei fotografando, em 1975, o edifício Martinelli em São Paulo. Era um prédio de luxo que virou uma favela. Um microcosmo de São Paulo, uma analogia perfeita para o que a cidade representava, com todas suas possibilidades, negligência, beleza, estranheza. Um lugar onde morava quem não podia ir para um lugar melhor e também quem havia optado ficar por lá (tinha até bar lá dentro). O fotógrafo aprende muito com o ensaio. Seu melhor trabalho começa a aparecer. Você faz, analisa, volta, faz de novo, pesquisa as várias formas de se fazer fotografia, troca ideias com outros fotógrafos, faz de novo outra vez, e, acima de tudo, consegue se aprofundar e disso vem a maior satisfação de todas: o conhecimento.

OLHA, VÊ O senhor é autor de 13 livros de fotografia. Qual a importância, para a carreira de um fotógrafo, ter a sua obra publicada? Quais são as dificuldades de publicar livro de fotografia no Brasil?

CLAUDIO EDINGER O livro é fundamental para a carreira do fotógrafo. Fica registrado tudo o que ele tem a dizer. E serve pra ele como parâmetro, como medida de sua evolução. Eu olho livros que fiz e aprendo muito com eles. A cada ano, a cada mês, a cada dia, nossa maneira de ver as coisas muda. Com cada livro a gente aprende mais um pouco. E claro, divide com o público essa experiência e conhecimento. O livro mais que qualquer outro meio ensina a todos a ver como vê o fotógrafo e, como dizia o fotógrafo americano Edward Steichen, um dos grandes teóricos da fotografia da primeira metade do século 20, “aprendendo a ver as pessoas aprendem a sentir”. Eu não vejo dificuldades em se publicar um livro. A dificuldade é em fazer um ensaio que mereça virar livro. O resto é conseqüência natural. Se o ensaio é bom tá lotado de gente por aí (editoras, patrocinadores) loucos atrás de livros bons pra publicar.

Estação da Luz | 2006

Minhocão | 2006

OLHA, VÊ O seu último livro “São Paulo minha estranha cidade linda” traz imagens de uma grande metrópole. Um tema bem concreto com uma representação quase onírica. O efeito do foco da câmera grande formato nos remete a algo surreal. A fotografia precisa de mais ficção?

CLAUDIO EDINGER A fotografia é só uma linguagem. Pode ser ficção ou não, tanto faz. Cada um tem uma história pra contar e as histórias são infinitas. Se você pegar cem fotógrafos fazendo São Paulo terá cem São Paulos diferentes. A verdade é que nós é que precisamos ver coisas novas. É a guerra contra o óbvio em que todos nós artistas estamos engajados. A fotografia oferece infinitas possibilidades ao artista. Pode ser ficção ou não ficção, o que vale é fazer imagens que obriguem as pessoas a enxergar melhor, a refletir, a se conhecer, a se desenvolver. Somos todos nós muito deficientes: ouvimos mal, falamos mal, respiramos mal, vemos mal. Ou talvez colocado de uma maneira mais positiva, podemos melhorar de uma forma infinita o quanto vemos, ouvimos, falamos. E quanto mais progredimos mais prazer (e dor) temos com isso. Dor por que descobrimos o quanto desconhecemos. O que é um barato, o que me interessa, é conseguir mais conhecimento. A fotografia é um dos melhores instrumentos para isso. São Paulo é uma cidade absolutamente ambígua. Então, pra mim, o foco seletivo é perfeito pra se retratar a cidade. Temos um dos museus mais lindos mundo, o Masp, com uma coleção invejável – que não tem grana pra pagar a conta de luz, cuja obra é roubada por dois vagabundos de rua. Temos a praça Ramos de Azevedo, lindíssimo lugar onde não se pode caminhar à noite porque é perigosa. E assim vai. É uma cidade que virou a rotina de todos, uma cidade que paramos de enxergar. Quando isso acontece a cidade pára de evoluir. O tipo de fotografia que me interessa é a que existe para lembrar as pessoas que a rotina é ridícula, que a acomodação é ridícula, que viver sem tentar entender por que estamos aqui é uma coisa ridícula, que não faz nenhum sentido.

OLHA, VÊ A atual Fotografia Brasileira está se “descolando” daquela fotografia dos anos 1970 e 1980, que se baseava mais no documental e fotojornalismo?

CLAUDIO EDINGER A fotografia mundial está passando por isso. Vivemos um momento revolucionário e os trabalhos que estão aparecendo agora são os melhores trabalhos que, em minha opinião, a fotografia já viu. A Fotografia Brasileira está começando a sair do ovo enquanto Fotografia Brasileira. Até agora não existia uma Fotografia “Brasileira”, existiam brasileiros sim, fazendo fotografia. Mas ainda não desenvolvemos uma escola própria, uma linguagem própria facilmente identificada. Na verdade, é difícil mesmo achar que exista uma fotografia alemã, ou japonesa ou americana ou francesa – e estas talvez sejam as escolas mais definidas dentro da fotografia. A fotografia é uma linguagem universal, o esperanto sonhado por alguns. E como linguagem universal ela influencia e é influenciada por todos. Os japoneses são influenciados por americanos, que foram influenciados por franceses, que influenciam os alemães e assim por diante.

OLHA, VÊ Durante os vinte anos vividos em Nova York, você tinha contato com a fotografia feita no Brasil? Como foi a sua volta após duas décadas?

CLAUDIO EDINGER Eu vinha ao Brasil todo ano, passava três meses aqui fotografando e vendo os amigos. A volta foi uma coisa natural. Eu tinha vários livros prontos e a editora DBA aqui queria publicá-los. Conseguimos vários parceiros internacionais e um por um os livros foram saindo. Sabe Deus o que teria acontecido com meus livros se não tivesse voltado. Eu fotografei um escritor no Chelsea Hotel, autor de 34 livros, se não me engano, mas nenhum publicado. Dirigia uma limusine pra ganhar a vida. Eu vivia com medo de acabar assim…

OLHA, VÊ Você trabalha com filme médio e grande formato. Com a tecnologia digital, aquele “tempo/relação” de esperar para ver o filme revelado, as cópias e todo o resto se perdeu. É apenas um saudosismo ou um valor agregado ao produto final?

CLAUDIO EDINGER Valor agregado. A foto digital, pelo menos para o que faço, ainda não chegou lá. Além disso o back 4×5 digital não é full frame. E exige que além de eu andar com o back (que custa uns cem mil reais aqui), eu ande também com um laptop. Minhas fotos são sempre (pelo menos São Paulo e Rio) em áreas de muito risco. Se eu ainda tivesse que me preocupar com mais duas coisas acho que não conseguiria. Mas além disso a qualidade do filme, a textura do filme é linda.

Quanto ao tempo para ver o filme revelado, eu uso muito Polaroids (que hoje são Fuji) e fotografo também com uma digital ou o iPhone para ver como fica. Com a 4×5 faço em média duas, às vezes três, chapas por foto. Isso só é possível por causa do Polaroid e da digital pequena.

Ipanema | 2001

Jardim de Alá | 2001

Paris | 2008

Paris | 2008

Comentários 14

  1. Pingback: Olha, vê | Alexandre Belém » Tamarineira

Deixe um comentário